domingo, 20 de abril de 2008

Maçãs, Caravanas, Amor platónico, Arte, Salazar, Merda, Idealismo e Materialismo













Ontem estive no Gato Vadio para a apresentação do livro "Caravana" do Rui Amaral. À entrada, apareceu ele gentilmente a oferecer maçãs. O livro, a "Caravana" começa precisamente com esta curta definição de Literatura: "Uma macieira que dá laranjas".
Foi bem jogado. Mas, penso eu com os meus botões, afinal eram maçãs ou laranjas?

Quem lá esteve, saberá. E quem lá esteve também ouviu o Rui Amaral ler um dos contos do livro que dá pelo nome "Amor Platónico":

"Para passar o tempo, Platão decidiu divertir-se à custa da sensibilidade de certos poetas. Pois bem, o que fez Platão? Inventou o amor platónico.
Depois, aborrecido com a sua própria invenção, saiu de casa e foi às putas."

Bem, uma coisa vos garanto, este livro não vos deixará aborrecido como Platão. Acho eu. O Rui Lage na apresentção que o Rui Amaral é do mesmo universo do Jorge Luis Borges e do português Gonçalo Tavares, e pelo que li e vi e ouvi, subscrevo.


Outra coisa: isto aconteceu na Rua do Rosário, que é transversal à Rua Miguel Bombarda, onde esteve a decorrer mais uma, como é que se diz, arty party for arty people. Então andámos por ali a espreitar dezenas de galerias de arte ali inauguradas, com animações pela rua toda. Tudo isto com o patrocínio da Famous Grouse. Sim, Whisky à borla. Mas, devo dizer, a maioria das galeria foram uma decepção.

Algumas lá para o fim, ainda me prenderam um pouco, mas... assustam-me algumas tendências que ali vejo espelhadas. Uma tela enorme com a cara do Salazar em mutação de umas fotografias lá do gajo. Sim, gajo. Tratou-se de dar um ar cool, diria, uma gaijificação do Salazar. O que interessa é chocar e tal, ya, tá-se bem. Trata-se da fórmula modernista já gasta de quebrar o tabu. E assim, a arte prossegue de revolução em revolução sem nunca sair da merda. Sim, merda no sentido mais sociológico (de Zygmunt Bauman, por exemplo) do termo se quisermos. Houve aquele conhecido senhor cuja famosa obra era um lata de merda chamada "mérde d'artiste". Não é que recentemente o museu que detem a "lata", teve mesmo a lata de abrir a lata, constatar que ela estava vazia, protestou e reclamou pela falta da dita "merda"! Sim, pois tratava-se de muito dinheiro diziam.

Pois, justamente Freud lembrava como o dinheiro é o correspondente simbólico da "merda". A nossa relação com a merda (e o dinheiro, por consequência) é estabelecida na fase anal quando temos uns três aninhos e temos de controlar o nosso esfincter para aprendermos a não nos borrarmos sozinhos. A sabermos tomar conta da nossa higiene. O prazer do controlo é um prazer da fase anal. As neuroses obsessivas, denotam uma fixação nessa fase (daí que um obsessivo se evoluir na sua neurose, possa ter compulsões de limpeza, etc). E é neste sentido que eu digo que há um tipo de arte que por aí abunda, que é uma arte meramente merdosa (controlo da merda=dinheiro) e isto é o mesmo que tal como vivemos numa sociedade que só pensa em dinheiro (dinheiro=merda).
















Mas não quero dar a ideia de que tudo é mau e tal, este mundo está perdido, etc. É bom haver estes eventos aqui na bela cidade do Porto e que envolvam muita gente, como foi o caso de ontem. Admito que haja quem simplesmente tenha saudade do Salazar. Eu, contudo, tenho saudades de um Portugal que ainda não existe. Sou um utópico. E arte não deve viver sufocada pelo dinheiro. A economização e mercantilismo da arte subverte a própria produção artística, torna-a um produto obsessivo de controlo. Impede a expressão utópica num mundo em que vemos a história a ser reescrita vezes sem conta num movimento de eterno retorno, por questões económicas.

Precisamos de um futuro. E o futuro começa na arte. Nisto sou um idealista. Um comunista idealista, se quisermos. Parece uma contradição. É-o de facto. E também o capitalismo vive das suas contradições. Mas as contradições só são visíveis à luz de um pensamento dialéctico. Já vi materialistas assumidos adoptarem posições tremendamente idealistas, e idealistas revelarem um muito básico materialismo. Seja como for, precisamos de um futuro, e de uma arte que o pinte, não necessariamente através de um realismo soviético, que visto de certa forma, é altamente idealista.

A arte acontece todos os dias. Estar vivo é um acontecimento artístico. A arte é um momento revelado em sua eternidade. A arte é um nó que se dá ao tempo. Um acontecimento que quer ser memória e que se transmuta em acontecimento. O artista é somente um intermediário. Somos todos. Mediadores do espaço e do tempo. Traçamos as linhas e guardamos a boa forma. Ver a linha formada pelo bando de aves, a forma do vento das folhas, a geometria dos limites do mundo. Cérebros são como galáxias, com constelações de neurónios: ursa maior, ursa menor, neurose, imagem do sapato azul, chuva e sistemas abertos. A arte é a beleza primeira, garante da esperança última, na luta do homem com o caos.

2 comentários:

Anônimo disse...

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Anônimo disse...

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