terça-feira, 7 de abril de 2009

Sobre Darwin e a Evolução: Marx, Engels, Lenine, Freud, Deleuze e Chestov

"Darwin, que estou neste momento a ler, é absolutamente esplêndido. Havia um aspecto da teleologia que faltava ser demolida, e isso agora encontra-se realizado. Nunca anteriormente foi feita uma tentativa tão grandiosa de demonstrar a evolução histórica na natureza, ou pelo menos de forma tão feliz. Temos, claro, que aturar o cru método inglês. (...) "É notável como Darwin reconhece entre animais e plantas sua sociedade inglesa com sua divisão de trabalho, competição, abertura de novos mercados, 'invenções' e a 'luta pela existência' malthusiana. É o 'bellum omnium contra ommnes' (guerra de todos contra todos) de Hobbes, e lembra a Fenomenologia de Hegel onde a sociedade civil é descrita como um 'reino animal e espiritual', enquanto em Darwin o reino animal figura como sociedade civil".
Cartas de Marx a Engels entre 1859 e 1860

"Darwin não sonhou sequer em dizer que a origem da ideia da luta pela existência era a teoria de Malthus. O que ele diz é que a sua teoria da luta pela existência é a teoria de Malthus aplicada a todo mundo vegetal e animal. Por maior que fosse o deslize cometido por Darwin de aceitar, na sua ingenuidade, a teoria malthusiana, vê-se logo, a um primeiro exame, que, para se perceber a luta pela existência na natureza – que aparece na contradição entre a multidão inumerável de germes engendrados pela natureza, em sua prodigalidade, e o pequeno número desses germes que podem chegar à maturidade, contradição que, de fato, se resolve em grande parte numa luta, às vezes extremamente cruel, pela existência – não há necessidade das lunetas de Malthus. E, assim como a lei que rege o salário conservou o seu valor muito tempo depois de estarem caducos os argumentos malthusianos sobre os quais Ricardo a baseava, a luta pela existência pode igualmente ter lugar na natureza sem nenhuma interpretação malthusiana. De resto, os organismos da natureza têm, também eles, as suas leis de população, que estão pouco estudadas, mas cuja descoberta será de importância capital para a teoria do desenvolvimento das espécies. E quem, senão Darwin, deu o impulso decisivo nessa direção?"
Carta de Friedrich Engels a Pyotr Lavrov

“Tal como Darwin pôs um fim à visão das espécies animais e de plantas como sendo desconectadas, fortuitas, 'criadas por Deus' e imutáveis, e tendo sido o primeiro a colocar a bilogia numa base absolutamente científica através do estabelecimento da mutabilidade e da sucessão das espécies, assim Marx pôs fim à visão da sociedade como agregação de indivíduos sujeitos a todos os tipos de modificações sob a vontade das autoridades (ou, se quisermos, sob a vontade da sociedade ou governo) que emergem e mudam casualmente, tendo sido o primeiro a colocar a sociologia numa base científica, através do estabelecimento do conceito da formação económica da sociedade como soma total das relações de produção, estabelecendo o facto de esse desenvolvimento ser um processo da história da natureza."
Tradução de Lenin’s Collected Works, Vol. 1

"No decorrer dos séculos, o ingénuo amor-próprio dos homens teve de submeter-se a dois grandes golpes desferidos pela ciência. O primeiro foi quando souberam que a nossa Terra não era o centro do universo, mas o diminuto fragmento de um sistema cósmico de uma vastidão que mal se pode imaginar. Isto estabelece conexão, em nossas mentes, com o nome de Copérnico, embora algo semelhante já tivesse sido afirmado pela ciência de Alexandria. O segundo golpe foi dado quando a investigação biológica destruiu o lugar supostamente privilegiado do homem na criação, e provou sua descendência do reino animal e sua inextirpável natureza animal. Esta nova avaliação foi realizada em nossos dias, por Darwin, Wallace e seus predecessores, embora não sem a mais violenta oposição contemporânea. Mas a megalomania humana terá sofrido seu terceiro golpe, o mais violento, a partir da pesquisa psicológica da época actual, que procura provar o ego que ele não é senhor nem sequer em sua própria casa, devendo, porém, contentar-se com escassas informações acerca do que acontece inconscientemente em sua mente."

Sigmund Freud em "Conferências Introdutórias sobre Psicanálise, 1917"

A grande novidade de Darwin talvez tenha sido a de instaurar o pensamento da diferença individual. (...) O problema de Darwin apresenta-se em termos muito semelhantes àqueles de que Freud se servirá noutra ocasião: trata-se de saber em que condições pequenas diferenças, livres, flutuantes ou não ligadas, se tornam diferenças apreciáveis, ligadas e fixas. Ora, é a selecção natural, desempenhando verdadeiramente o papel de um princípio da realidade e mesmo de sucesso, que mostra como diferenças se ligam e se acumulam numa direcção, mas também como elas tendem cada vez mais a divergir em direcções diversas e mesmo opostas.

Gilles Deleuze em Diferença e Repetição

"A=A. Dizem que a lógica não precisa deste postulado e que poderia facilmente desenvolvê-lo por dedução. Penso que não. Pelo contrário, na minha opinião, a lógica não poderia existir sem esta premissa. Ao mesmo tempo, ela tem uma origem puramente empírica. No mundo dos factos, A é sempre mais ou menos igual a A. Mas poderia ser de outra forma. O Universo poderia ser constituído de forma a admitir as mais fantásticas metamorfoses. Aquilo que agora é igual a A, seria sucessivamente igual a B e a C, e por aí em diante. De momento uma pedra permanece durante bastante tempo como pedra, uma planta como uma planta e um animal como animal. Mas poderia acontecer a pedra transformar-se numa planta diante dos nossos olhos, e a planta num animal. Que não existe nada de impensável nesta suposição, é provado pela teoria da evolução. Esta teoria apenas coloca séculos no lugar de segundos.

Lev Chestov traduzido de "All things are possible"

6 comentários:

Álvaro Martins disse...

Acho que a teoria de Chestov está errada. Vejamos,
a teoria da evolução aponta essa evolução da espécie, contudo sabemos que essa espécie era originalmente orgânica, viva, e assim continuou, enquanto que uma pedra jamais poderia se transformar numa planta devido à incompatibilidade das espécies. Pedra = inorgânica / Planta = orgânica. Jamais um objecto inorgânico se poderá transformar num orgânico, seja em segundos, seja em séculos.

José Magalhães disse...

"sabemos que essa espécie era originalmente orgânica"

Toda a matéria orgânica teve a sua origem em matéria mineral de todo o tipo. As plantas inclusivamente alimentam-se de variadas matérias minerais (inorgânicas ou não).

Álvaro Martins disse...

"Toda a matéria orgânica teve a sua origem em matéria mineral de todo o tipo."

Sim, mas penso que se essa matéria mineral deu origem a toda a matéria orgânica, temos de aceitar que essa matéria mineral era já matéria orgânica. Ou seja, ela só se desenvolveu e originou a vida como a conhecemos, face a certos condicionamentos é verdade, mas teria que ter células ou algo de orgânico, porque o que é inorgânico é impossível de se tornar orgânico, de acordo com a lógica.
Mas como nem tudo se rege pela lógica...

José Magalhães disse...

Sim, talvez a distinção entre orgânico e inorgânico lança mais confusão do que esclarecimento sobre a questão. Talvez tudo seja "orgânico" e o universo seja um gigantesco "organismo", porque não.

Álvaro Martins disse...

Exacto. Quem sabe?!!

Massano Cardoso disse...

Diálogo sedutor!