O Hegel dizia que a história se movia por um processo dialéctico em que primeiro havia a tese, depois em resposta a antítese, e esta oposição seria resolvida por uma síntese dos dois anteriores. Esta síntese tornar-se-ia a tese seguinte à qual se seguiria uma antítese, e etc.. até ao infinito.
Também na história da música é perfeitamente viável vê-la de um ponto vista dialéctico hegeliano.
Aparentemente o punk do pessoal porco, de cabedal e crista na cabeça, surgiu como algo que não seria assimilável pelo antigo rock'and'roll das bandas vestidas de fatinho branco e gravata (atenção que me refiro a rock'n'roll e não rock no seu sentido mais vasto).
Perante a tese do rock'n'roll o punk seria uma oposição, uma antítese.
Se se pode falar numa síntese entre o rock'n'roll e o punk, temos que falar dos The Cramps. Com os seus acordes e sonaridades blues e rockabilly levados à distorção e a uma rudeza mais própria do Punk, usando de um imaginário Halloween que se revela totalmente adequado em termos filosóficos digamos assim, os Cramps são essa síntese perfeita entre punk e rock'n'roll.
Vejam aqui os rapazes em acção em com a música Goo Goo Muck:
quarta-feira, 27 de agosto de 2008
sexta-feira, 22 de agosto de 2008
Objectividade e Obscenidade: Baudrillard e Zizek
"Quando as coisas se tornam mais reais, e dadas e realizadas de forma imediata, é nesse curto-circuito que se faz com que essas coisas se aproximem cada vez mais, e estamos assim no domínio da obscenidade. (...)
Num mundo destes não existe uma comunicação, mas antes uma contaminação de tipo viral, porque tudo se passa de um para outro e de forma imediata. A palavra promiscuidade afirma a mesma coisa: existe imediatamente, sem distanciamento e sem encanto. E até sem verdadeiro prazer. (...)
Existem alguns excessos na obscenidade: apresentar o corpo nu pode ser já brutalmente obsceno, apresentá-lo descarnado, magro ou esquelético é-o ainda mais. De facto podemos observar hoje que toda a problemática crítica dos media se desenrola em redor desse limiar de tolerância para o excesso de obscenidade. Claro, tudo deve ser dito, tudo vai ser dito...
Mas a verdade objectiva é obscena. E mesmo quando nos descrevem todos os pormenores das actividades sexuais de Bill Clinton, a obscenidade é inteiramente irrisória e até nos perguntamos se não existe aí uma dimensão irónica. (...) A obscenidade , ou seja, a visibilidade total das coisas, é a tal ponto insuportável que se torna necessário aplicar uma estratégia da ironia para sobreviver"
Jean Baudrillard em "Palavras de Ordem"
"A sexualidade é a única pulsão travada em si própria, prevertida: ao mesmo tempo, insuficiente e excessiva, com o excesso como forma de aparecimento da falta. Por um lado, a sexualidade é caracterizada pela capacidade universal de proporcionar o sentido metafórico ou subentendido de qualquer actividade e objecto: qualquer elemento, incluindo a reflexão mais abstracta, pode ser experimentado como se «aludisse a isso». (...)
Este excedente universal - esta capacidade por parte da sexualidade de invadir qualquer domínio da experiência humana, de tal maneira que tudo, do alimento à excreção, da agressão ao nosso semelhante (ou agressão do nosso semelhante) ao exercício do poder, pode assumir uma conotação sexual - não é sinal da sua preponderância. É antes sinal de uma certa deficiência em termos estruturais: a sexualidade impele para fora de si própria e invade os sectores adjacentes, precisamente pelo motivo de não poder encontrar satisfação em si própria, pois nunca alcança o seu objectivo"
Slavoj Zizek em "David Lynch, ou a Depressão Feminina"
Num mundo destes não existe uma comunicação, mas antes uma contaminação de tipo viral, porque tudo se passa de um para outro e de forma imediata. A palavra promiscuidade afirma a mesma coisa: existe imediatamente, sem distanciamento e sem encanto. E até sem verdadeiro prazer. (...)
Existem alguns excessos na obscenidade: apresentar o corpo nu pode ser já brutalmente obsceno, apresentá-lo descarnado, magro ou esquelético é-o ainda mais. De facto podemos observar hoje que toda a problemática crítica dos media se desenrola em redor desse limiar de tolerância para o excesso de obscenidade. Claro, tudo deve ser dito, tudo vai ser dito...
Mas a verdade objectiva é obscena. E mesmo quando nos descrevem todos os pormenores das actividades sexuais de Bill Clinton, a obscenidade é inteiramente irrisória e até nos perguntamos se não existe aí uma dimensão irónica. (...) A obscenidade , ou seja, a visibilidade total das coisas, é a tal ponto insuportável que se torna necessário aplicar uma estratégia da ironia para sobreviver"
Jean Baudrillard em "Palavras de Ordem"
"A sexualidade é a única pulsão travada em si própria, prevertida: ao mesmo tempo, insuficiente e excessiva, com o excesso como forma de aparecimento da falta. Por um lado, a sexualidade é caracterizada pela capacidade universal de proporcionar o sentido metafórico ou subentendido de qualquer actividade e objecto: qualquer elemento, incluindo a reflexão mais abstracta, pode ser experimentado como se «aludisse a isso». (...)
Este excedente universal - esta capacidade por parte da sexualidade de invadir qualquer domínio da experiência humana, de tal maneira que tudo, do alimento à excreção, da agressão ao nosso semelhante (ou agressão do nosso semelhante) ao exercício do poder, pode assumir uma conotação sexual - não é sinal da sua preponderância. É antes sinal de uma certa deficiência em termos estruturais: a sexualidade impele para fora de si própria e invade os sectores adjacentes, precisamente pelo motivo de não poder encontrar satisfação em si própria, pois nunca alcança o seu objectivo"
Slavoj Zizek em "David Lynch, ou a Depressão Feminina"
quarta-feira, 13 de agosto de 2008
Segundo o Piso
Este Sábado vai abrir um novo espaço para exposições em Santo Tirso denominado "Segundo o Piso", junto ao Parque D. Maria II. A inaguração é já este sábado e contará com a presença dos trabalhos dos seguintes artistas: Daniel Da Costa, Hélder Almeida, Hélder Castro, Joana da Conceição e Micaela Amaral.
sexta-feira, 8 de agosto de 2008
A Música, Kierkegaard e os Estádios Eróticos Imediatos de Siddhartha Gautama e Nick Drake
O sentido da audição é o primeiro a desenvolver-se no ser humano, e é o mais fino no desenvolvimento das noções de sequência e de tempo. Sem estas noções está comprometida a capacidade de entender significados, comunicação, mensagem etc. Depois, toda a linguagem e comunicação não pode existir sem afectos, amor e relações de empatia. E a música é o melhor meio de exprimir o espírito da sensualidade.
Kierkegaard tem sobre esta questão uma reflexão interessante em "Estádios Eróticos Imediatos" que desenvolve na forma de comentário à ópera Don Giovanni de Mozart:
"The most abstract ideia conceivable is the spirit of sensuality. But in what medium can it be represented? Only in music.
It cannot be represented in sculpturem for in itself it is a kind of quality of inwardness. It cannot be painted, for it cannot be grasped in fixed contours, it is a energy, a storm, impatience, passion, and so on, in all their lyrical quality, existing not in a single moment but in a succession of moments, (...) it is not an epic, for it has not reached the level of words; it moves constantly in an immediacy. Nor can it be represented, therefore, in poetry. The only medium that can represent it is music. For music has an element of time in it yet it does not lapse in time"
Também Siddartha Gautama obteve a sua iluminação quando ouviu o som do rio a correr e nunca mais deixou de estar sintonizado com aquele rio. As pessoas iam ter com ele, aquele que mais tarde seria conhecido como Buda, e ele levava-os de uma margem para a outra, muitas das vezes sem saberem que estavam perante quem procuravam.
Nick Drake, esse cantor que morreu jovem tem uma música deliciosa chamada "The River Man":
Gonna see the river man
Gonna tell him all I can
'bout the ban
On feeling free.
If he tells me all he knows
About the way his river flows
I don't suppose
It's meant for me.
Oh, how they come and go
Oh, how they come and go
Este texto é parte de um comentário meu a uma bela reflexão no Blog "O Homem que Sabia Demasiado" que questiona se a música precisa de significado. Vale a pena espreitar.
Kierkegaard tem sobre esta questão uma reflexão interessante em "Estádios Eróticos Imediatos" que desenvolve na forma de comentário à ópera Don Giovanni de Mozart:
"The most abstract ideia conceivable is the spirit of sensuality. But in what medium can it be represented? Only in music.
It cannot be represented in sculpturem for in itself it is a kind of quality of inwardness. It cannot be painted, for it cannot be grasped in fixed contours, it is a energy, a storm, impatience, passion, and so on, in all their lyrical quality, existing not in a single moment but in a succession of moments, (...) it is not an epic, for it has not reached the level of words; it moves constantly in an immediacy. Nor can it be represented, therefore, in poetry. The only medium that can represent it is music. For music has an element of time in it yet it does not lapse in time"
Também Siddartha Gautama obteve a sua iluminação quando ouviu o som do rio a correr e nunca mais deixou de estar sintonizado com aquele rio. As pessoas iam ter com ele, aquele que mais tarde seria conhecido como Buda, e ele levava-os de uma margem para a outra, muitas das vezes sem saberem que estavam perante quem procuravam.
Nick Drake, esse cantor que morreu jovem tem uma música deliciosa chamada "The River Man":
Gonna see the river man
Gonna tell him all I can
'bout the ban
On feeling free.
If he tells me all he knows
About the way his river flows
I don't suppose
It's meant for me.
Oh, how they come and go
Oh, how they come and go
Este texto é parte de um comentário meu a uma bela reflexão no Blog "O Homem que Sabia Demasiado" que questiona se a música precisa de significado. Vale a pena espreitar.
quinta-feira, 7 de agosto de 2008
O cão e as dobras de Deleuze
Em jeito de "comentário ao comentário" feito no post anterior, que refere uma tendência em muitos dos posts que por aí pululam neste blog "em derrubar barreiras, encurtar distancias e estabelecer a comunicação entre elementos aparentemente díspares":
Diria que o que se trata aqui são de linhas de fuga, fluxos do desejo com seus cortes e recortes, um contínuo processo de desterritorialização e de reterritorialização. Em termos territoriais, a minha inspiração é Gilles Deleuze que, junto com Félix Guattari, penetraram em mim como um vírus sendo essa característica viajante do pensamento de que o comentador anónimo fala, um dos síntomas precisamente desse vírus.
Gilles Deleuze é o filósofo dos movimentos, das formas, dos terrítórios, não gosta de sítios fechados, poder-se-á até dizer que sofria de uma claustrofobia filosófica. Dizia que queria sair da Filosofia através da Filosofia.
Um documento valiosíssimo disponível a todos os mortais que Deleuze nos deixou foi o "Abecedário de Deleuze" que consiste numa entrevista com Claire Parnet gravada em vídeo, documento que, segundo a claúsula da entrevista, apenas podia ser revelado depois da sua morte
Começa com a palavra Animal, onde ele diz que (ao contrário do Iggy Pop ou do Padre António Vieira), nunca se identificou muito com o cão por ser um animal doméstico que ladra. O latido, para Deleuze é um momento de mau gosto na ordem estética da natureza. Deleuze nunca conheceu o famoso Mambo, canino com quem coabito e que tem a notável e louvável caracterísitca de nunca ladrar.
Vejam aqui um excerto da entrevista que mostra um pouco o alcance da filosofia de Deleuze que consegue ser uma inspiração para pintores, médicos, mecânicos, dobradores de papéis, surfistas, exército israelita, mosquitos, carrapatos, prostitutas, homens de negócios e os mais diversos modos de ser.
Gilles Deleuze: Quero sair da filosofia pela filosofia. É isso o que me interessa.
Claire Parnet: O que isso quer dizer?
Gilles Deleuze: Dou um exemplo, como isso é para depois de minha morte, posso deixar de ser modesto. Acabo de escrever um livro sobre um grande filósofo chamado Leibniz e insistindo em uma noção que me parece importante nele, mas que é muito importante para mim: a noção de dobra. Considero que fiz um livro de filosofia sobre essa noção, um pouco estranha, de dobra. O que me acontece depois? Recebo cartas, como sempre, há cartas insignificantes, mesmo se são encantadoras e calorosas, e me toquem muito. São cartas que me dizem, muito bem... são cartas de intelectuais que gostaram ou não do livro. E então recebo duas cartas, dois tipos de cartas, em que esfrego os olhos... Há cartas de pessoas que dizem: "Mas sua história de dobra, somos nós". E percebo que são pessoas que fazem parte de uma associação que agrupa 400 pessoas na França, hoje, e deve crescer. É a associação de dobradores de papéis, eles têm uma revista, me enviam a revista e dizem: "Concordamos totalmente, o que você faz é o que fazemos". Digo para mim: isso eu ganhei. Recebo outra carta, e falam da mesma maneira e dizem: "A dobra somos nós". É uma maravilha.
Primeiro isso lembra Platão, porque em Platão... os filósofos, para mim, não são pessoas abstratas, são grandes escritores, grandes autores bem concretos. Em Platão há uma história que me enche de alegria, e está ligada ao início da filosofia, voltaremos a isso depois. O tema de Platão é: ele dá uma definição, por exemplo, o que é o político? O político é o pastor dos homens, e sobre isso há muita gente que diz: o político somos nós, por exemplo, o pastor chega e diz: visto os homens, logo sou o verdadeiro pastor dos homens. O açougueiro diz: alimento os homens, sou o pastor dos homens. Os rivais chegam... Tive esta experiência, os dobradores de papéis chegam e dizem: a dobra somos nós. Os outros, que me enviaram o mesmo tipo de carta, é incrível, foram os surfistas. À primeira vista não há relação alguma com os dobradores de papéis. Os surfistas dizem: "concordamos totalmente, pois, o que fazemos? Estamos sempre nos insinuando nas dobras da natureza. Para nós, a natureza é um conjunto de dobras móveis. Nós nos insinuamos na dobra da onda, habitar a dobra da onda é a nossa tarefa". Habitar a dobra da onda e, com efeito, eles falam disso de modo admirável. Eles pensam, não se contentam em surfar, eles pensam o que fazem. Voltaremos a falar disto se chegarmos ao esporte [sport], ao S...
Claire Parnet: Está longe. Partimos do encontro, são encontros, os dobradores de papéis?
Gilles Deleuze: São encontros. Quando digo sair da filosofia pela filosofia... Sempre me aconteceu isso, são encontros, encontrei os dobradores de papéis, não preciso vê-los, aliás, ficaríamos decepcionados, provavelmente, eu ficaria, e eles ainda mais. Não preciso vê-los, mas tive um encontro com o surfe, com os dobradores de papéis, literalmente, saí da filosofia pela filosofia, é isso um encontro.
Diria que o que se trata aqui são de linhas de fuga, fluxos do desejo com seus cortes e recortes, um contínuo processo de desterritorialização e de reterritorialização. Em termos territoriais, a minha inspiração é Gilles Deleuze que, junto com Félix Guattari, penetraram em mim como um vírus sendo essa característica viajante do pensamento de que o comentador anónimo fala, um dos síntomas precisamente desse vírus.
Gilles Deleuze é o filósofo dos movimentos, das formas, dos terrítórios, não gosta de sítios fechados, poder-se-á até dizer que sofria de uma claustrofobia filosófica. Dizia que queria sair da Filosofia através da Filosofia.
Um documento valiosíssimo disponível a todos os mortais que Deleuze nos deixou foi o "Abecedário de Deleuze" que consiste numa entrevista com Claire Parnet gravada em vídeo, documento que, segundo a claúsula da entrevista, apenas podia ser revelado depois da sua morte
Começa com a palavra Animal, onde ele diz que (ao contrário do Iggy Pop ou do Padre António Vieira), nunca se identificou muito com o cão por ser um animal doméstico que ladra. O latido, para Deleuze é um momento de mau gosto na ordem estética da natureza. Deleuze nunca conheceu o famoso Mambo, canino com quem coabito e que tem a notável e louvável caracterísitca de nunca ladrar.
Vejam aqui um excerto da entrevista que mostra um pouco o alcance da filosofia de Deleuze que consegue ser uma inspiração para pintores, médicos, mecânicos, dobradores de papéis, surfistas, exército israelita, mosquitos, carrapatos, prostitutas, homens de negócios e os mais diversos modos de ser.
Gilles Deleuze: Quero sair da filosofia pela filosofia. É isso o que me interessa.
Claire Parnet: O que isso quer dizer?
Gilles Deleuze: Dou um exemplo, como isso é para depois de minha morte, posso deixar de ser modesto. Acabo de escrever um livro sobre um grande filósofo chamado Leibniz e insistindo em uma noção que me parece importante nele, mas que é muito importante para mim: a noção de dobra. Considero que fiz um livro de filosofia sobre essa noção, um pouco estranha, de dobra. O que me acontece depois? Recebo cartas, como sempre, há cartas insignificantes, mesmo se são encantadoras e calorosas, e me toquem muito. São cartas que me dizem, muito bem... são cartas de intelectuais que gostaram ou não do livro. E então recebo duas cartas, dois tipos de cartas, em que esfrego os olhos... Há cartas de pessoas que dizem: "Mas sua história de dobra, somos nós". E percebo que são pessoas que fazem parte de uma associação que agrupa 400 pessoas na França, hoje, e deve crescer. É a associação de dobradores de papéis, eles têm uma revista, me enviam a revista e dizem: "Concordamos totalmente, o que você faz é o que fazemos". Digo para mim: isso eu ganhei. Recebo outra carta, e falam da mesma maneira e dizem: "A dobra somos nós". É uma maravilha.
Primeiro isso lembra Platão, porque em Platão... os filósofos, para mim, não são pessoas abstratas, são grandes escritores, grandes autores bem concretos. Em Platão há uma história que me enche de alegria, e está ligada ao início da filosofia, voltaremos a isso depois. O tema de Platão é: ele dá uma definição, por exemplo, o que é o político? O político é o pastor dos homens, e sobre isso há muita gente que diz: o político somos nós, por exemplo, o pastor chega e diz: visto os homens, logo sou o verdadeiro pastor dos homens. O açougueiro diz: alimento os homens, sou o pastor dos homens. Os rivais chegam... Tive esta experiência, os dobradores de papéis chegam e dizem: a dobra somos nós. Os outros, que me enviaram o mesmo tipo de carta, é incrível, foram os surfistas. À primeira vista não há relação alguma com os dobradores de papéis. Os surfistas dizem: "concordamos totalmente, pois, o que fazemos? Estamos sempre nos insinuando nas dobras da natureza. Para nós, a natureza é um conjunto de dobras móveis. Nós nos insinuamos na dobra da onda, habitar a dobra da onda é a nossa tarefa". Habitar a dobra da onda e, com efeito, eles falam disso de modo admirável. Eles pensam, não se contentam em surfar, eles pensam o que fazem. Voltaremos a falar disto se chegarmos ao esporte [sport], ao S...
Claire Parnet: Está longe. Partimos do encontro, são encontros, os dobradores de papéis?
Gilles Deleuze: São encontros. Quando digo sair da filosofia pela filosofia... Sempre me aconteceu isso, são encontros, encontrei os dobradores de papéis, não preciso vê-los, aliás, ficaríamos decepcionados, provavelmente, eu ficaria, e eles ainda mais. Não preciso vê-los, mas tive um encontro com o surfe, com os dobradores de papéis, literalmente, saí da filosofia pela filosofia, é isso um encontro.
segunda-feira, 4 de agosto de 2008
Os Cães de Iggy Pop e Padre António Vieira
No ensaio Dois Cães, Alcir Pécora diz sobre o cão que:
"na hora da identidade em perigo, o animal latiu no sermão de Vieira e também na voz de Iggy Pop" (...)
"O primeiro (Iggy Pop) berrava que queria ser o meu cachorro, a qualquer preço; o segundo protestava reiteradamente ao Superior dos Jesuítas na Província de Portugal, quando se encontrava na iminência de ser expulso da ordem por conta das várias intrigas políticas em que se envolvera, que preferia ser um cão à porta da Companhia de Jesus do que receber a máxima investidura eclesiástica em Portugal. De fato, El-Rei lhe oferecera qualquer posto, como compensação do afastamento da ordem." (...)
"Ambos, em algum momento de sua vida, julgaram que um cão era a melhor figura de sua identidade em perigo, e então acharam que deveriam repeti-lo para mim, sincronizando tempos, lugares e línguas distantes. Fizeram isso uma vez, outra vez, e depois por dias e anos a fio."
Vejam também o rockeiro de 61 anos aqui a berrar I Wanna be Your Dog, numa excelente actuação em Bruxelas perante um público extasiado e animado como se estivesse a ouvir um sermão do Padre António Vieira:
"na hora da identidade em perigo, o animal latiu no sermão de Vieira e também na voz de Iggy Pop" (...)
"O primeiro (Iggy Pop) berrava que queria ser o meu cachorro, a qualquer preço; o segundo protestava reiteradamente ao Superior dos Jesuítas na Província de Portugal, quando se encontrava na iminência de ser expulso da ordem por conta das várias intrigas políticas em que se envolvera, que preferia ser um cão à porta da Companhia de Jesus do que receber a máxima investidura eclesiástica em Portugal. De fato, El-Rei lhe oferecera qualquer posto, como compensação do afastamento da ordem." (...)
"Ambos, em algum momento de sua vida, julgaram que um cão era a melhor figura de sua identidade em perigo, e então acharam que deveriam repeti-lo para mim, sincronizando tempos, lugares e línguas distantes. Fizeram isso uma vez, outra vez, e depois por dias e anos a fio."
Vejam também o rockeiro de 61 anos aqui a berrar I Wanna be Your Dog, numa excelente actuação em Bruxelas perante um público extasiado e animado como se estivesse a ouvir um sermão do Padre António Vieira:
sexta-feira, 1 de agosto de 2008
Zen, Alan Watts e Sérgio Godinho
"O nosso problema está em que o poder do pensamento nos dá a capacidade de construir símbolos de coisas, estranhos às próprias coisas, incluindo a de criar um símbolo, uma ideia de nós próprios, estranha a nós próprios. Porque a ideia é muito mais apreensível do que a realidade, e o símbolo muito mais estável que o facto, aprendemos a identificar-nos com a ideia que fizemos de nós próprios. (...)
Daí a intuição subjectiva de um "ego" que "tem" uma mente, de um sujeito interiormente isolado a quem sucedem experiências não desejadas. Com a característica enfâse que pôe no concreto, o Zen indica que o nosso precioso "ego" é apenas uma ideia, bastante útil e legítima se for tomada pelo que é, mas desastrosa se identificada com a nossa verdadeira natureza. Dir-se-ia, pois, que o libertar-se da distinção subjectiva entre "eu" e "minha experiência", é descobrir a verdadeira relação entre mim e o mundo "exterior" (...)
Alan Watts em "O Budismo Zen"
"Pode alguém ser quem não é,
Pode alguém ser quem não é
Pode alguém ser quem não é?"
Ségio Godinho
Daí a intuição subjectiva de um "ego" que "tem" uma mente, de um sujeito interiormente isolado a quem sucedem experiências não desejadas. Com a característica enfâse que pôe no concreto, o Zen indica que o nosso precioso "ego" é apenas uma ideia, bastante útil e legítima se for tomada pelo que é, mas desastrosa se identificada com a nossa verdadeira natureza. Dir-se-ia, pois, que o libertar-se da distinção subjectiva entre "eu" e "minha experiência", é descobrir a verdadeira relação entre mim e o mundo "exterior" (...)
Alan Watts em "O Budismo Zen"
"Pode alguém ser quem não é,
Pode alguém ser quem não é
Pode alguém ser quem não é?"
Ségio Godinho
Assinar:
Postagens (Atom)