segunda-feira, 29 de setembro de 2008

A Inteligência Paradoxal de Soren Kierkegaard

Tenho andado a ler "Migalhas Filosóficas" de Soren Kierkegaard, onde, por intermédio do seu pseudónimo Johannes Clímacus, assume o papel de um pensador secular que faz uma interpretação de questões como a existência, Deus, o amor e o desconhecido. No seu estilo ao mesmo tempo sério e humorado, ligeiro e profundo, Kierkegaard tem no capítulo "O Paradoxo Absoluto - Um Capricho Metafísico", passagens fabulosas como estas:

"Não é necessário pensar mal do paradoxo, pois o paradoxo é a paixão do pensamento, e o pensador sem um paradoxo é como o amante sem paixão, um tipo medíocre. Mas a potência mais alta de qualquer paixão é sempre querer a sua própria ruína e assim também a mais alta paixão da inteligência consiste em querer o choque, não obstante o choque, de uma ou de outra maneira, tenha de tornar-se a sua ruína. Assim, o maior paradoxo do pensamento é querer descobrir algo que ele próprio não possa pensar. (...)

Mas o que é este desconhecido contra o qual a inteligência em sua paixão paradoxal se choca, e que perturba o homem em seu autoconhecimento? É o desconhecido. No entanto, ele não é, certamente, um ser humano, na medida em que o homem sabe o que o homem é, nem qualquer outra coisa que o homem conheça. Chamemos então este desconhecido: o deus. É apenas um nome que lhe damos. Dificilmente ocorreria à inteligência querer provar que esse desconhecido (o deus) existe de facto. (...)

Em geral, provar que qualquer coisa existe é sempre uma questão difícil: sim, o que é ainda pior para os corajosos que a tanto se atrevem, a dificuldade é tal que a celebridade raramente aguarda aqueles a que a isso se dedicam. A demonstração toda se transforma em algo completamente diferente, em um desenvolvimento exterior da conclusão que tiro ao ter admitido que o objecto em questão existe. (...)

Assim, eu não provo que uma pedra existe, mas sim que algo, que de facto existe, é uma pedra; o tribunal não prova que um criminoso existe, mas prova que o acusado, que evidentemente existe, é um criminoso. (...) Caso alguém quisesse, a partir dos feitos de Napoleão, provar a existência de Napoleão, não seria este um procedimento sumamente estranho? (...)

A paixão paradoxal da inteligência choca-se portanto constantemente contra este desconhecido, que decerto existe, mas que também é desconhecido, e nesta medida inexistente. A inteligência não pode vir mais longe: mas o seu sentido do paradoxo leva-a a aproximar-se do obstáculo e a ocupar-se dele; porque, pretender exprimir a sua relação com ele negando a existência daquele desconhecido, não dá certo, visto que o enunciado desta negação envolve precisamente uma relação."

Por esta altura vai-se tornando cada vez mais difícil continuar a seleccionar e copiar para aqui o melhor deste capítulo, pois tudo me parece demasiadamente importante para deixar de lado e sem o qual não se percebe a totalidade. Resta-me apenas com estas trancrições deixar crescer um pouco de apetite nas inteligências mais vorazes e paradoxais que nos acompanham, e fazer uma modesta propaganda deste meu velho mestre.

“Kierkegaard é de longe o mais profundo pensador do século XIX.”, dizia Ludwig Wittgenstein. Considerado o pai do existencialismo, Kierkegaard tem uma obra que é filha fiel da sua existência. Agustina Bessa Luís fez-lhe em tempos uma homenagem na forma de um texto dramático denominado "Os Estados Eróticos Imediatos de Soren Kierkegaard", onde põe em cena partes ficcionadas da vida atribulada deste pensador.

Ironia, coincidência ou não, ao mesmo tempo que vou lendo estas migalhas filosóficas, soube que este texto dramático foi trazido à vida pela companhia Seiva Trupe, e estreou dia 25 no Teatro Campo Alegre onde vai estar até dia 31 de Outubro. Ainda não fui ver mas tenho tempo. Teatro, Kierkegaard e Agustina, são nutrientes fugazes da humanidade que demoram uma vida a digerir. Já dizia Agustina, "O tempo apaga devagar o que a terra leva depressa."

5 comentários:

Victor Gonçalves disse...

Boa propaganda ao mestre da ironia, da irrisão, do fragmento, da máscara, da angústia, do niilismo...

Victor Gonçalves disse...

Boa propaganda ao mestre da ironia, da irrisão, do fragmento, da máscara, da angústia, do niilismo...

José Magalhães disse...

kierkegaard é um monstro e um anjo, um palhaço e um juiz, padre e sedutor, angustiante e edificante, histérico e obsessivo, cristão de um cristianismo que nunca existiu, inventor de um sistema de filosofia anti-sistémica e poeta sem poemas

Anônimo disse...

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